Onde se traçam os limites das nossas relações com outros é frequentemente algo que se revela dificil de discernir. O direito a ultrapassar esses limites é um que não temos, mas que usamos com mais frequência do que deveríamos.
Com facilidade excessiva, e porque as coisas nem sempre nos correm de feição, explodimos com aqueles que estão do nosso lado, que nos querem bem e que até escutam o que não merecem. Dar valor a isto nem sempre é fácil. Por vezes é preciso que sejamos alvo de uma dessas atitudes para darmos o valor a alguns dos anjos que nos acompanham pela vida e em quem muitas vezes, demasiadas, aguentam os resultados das nossas frustrações.
Como é natural, somos sempre mais sensiveis ao que nos afecta do que à forma como afectamos os outros. A grande questão é, o que fazer quando nos encontramos entre um ego ferido com responsabilidades sobre a nossa auto-estima, e um amigo que representa bastante para nós. Se optamos por uma protecção de quem somos e nos defendemos, satisfazemos o impulso correspondente à nossa sobrevivência emocional; resposta à letra. Se pensamos nas consequências e ponderamos sobre se valerá o risco de terminar uma amizade, o mais certo é engolirmos o sapo e acabamos por deixar passar, ao mesmo tempo que sacrificamos a nossa auto-estima.
Podemos escolher qualquer caminho, mas nunca nos livramos de sofrer com palavras que são ditas no calor do momento. Magoa, fere com uma precisão cirurgica. Uma lingua afiada consegue atingir o coração com mais facilidade do que uma espada. Na sombra ficam a sofrer os nossos anjos, em que só repararemos quando nos faltarem numa daquelas alturas em que recorremos a eles. Vão ficando por perto porque ponderam nas consequências e não querem perder-nos. Por isso continuam a aguentar uma e outra ofensa, fazendo das tripas coração e engolindo sapos. Há que ter cuidado para que um dia esses amigos não deixem de fazer contas à vida e passem a contabilizar a diferença entre o que dão de si e o que recebem de nós.
Provavelmente nessa altura vamos descobrir que já não existe em quem descarregar as nossas frustrações. Mas de onde vêm estas reacções mais ou menos violentas? De onde chegam estas faltas de paciência, de disponibilidade, por vezes de solidariedade? Mesmo que não sejam intencionais, acabam por gerar um afastamento entre as pessoas.
Talvez seja bom procurarmos perguntas às quais responder, antes que os anjos que nos rodeiam resolvam usar as suas asas para voar para longe das agressões a que os sujeitamos a fim de protegerem a sua auto-estima, cansados de engolir sapos e de fingir que o saldo dos relacionamentos é positivo.